4.6.06

Banzo


Parece que quando você passa muito tempo fora, o familiar se torna estranho. Olho pra Recife e não me reconheço, e isso me deixa infeliz. Os lugares que frequentava não existem mais, ou já não prestam; e isso vale do supermercado ao barzinho. Tudo é uma experiência meio nova, embora nem sempre ruim, devo ressaltar. A cidade me invade pelos cinco sentidos. O ar de Recife é mais fino, a claridade dói na vista, o céu é quase branco, lavado. O cheiro de mangue, de jambo, dos jasmins de Olinda chega em mim fisicamente, quase como uma pancada. Aqui sinto a seda prateada dos cabelos da minha avó que não me reconhece mais, o cetim da pele de Luiza que está me estranhando menos, e a maciez de outros braços e abraços que me apertam com gosto. Aqui como o pudim de Julia, o risoto de Dadá, a tapioca da Sé, e engulo a saudade. Ouço o sotaque cantado dos meus conterrâneos, que me soa mais alto, mais aberto, mais luminoso que nunca, e as risadas dos meus amigos tilintam como sinos. Felicidade agridoce, essa, de passar dez dias como um relâmpago num lugar onde não tenho mais lugar, mas que é meu lar eternamente.

Publicado originalmente no Sítio de Maricota, em 17 de novembro de 2005.

Angústia


Eu machuco sem querer quem está por perto, eu me machuco de ver os outros se machucarem, eu me desespero e nem sei o motivo de estar desesperada, eu não sei nada de mim que possa usar como desculpa, eu sou um porco espinho que precisa muito de abraços.

Postado no Sítio de Maricota, em 03 de novembro de 2005.