11.5.07

Das dádivas de ensinar


Entre as várias atribuições do cargo de professor, uma das que mais vem mexendo comigo é a orientação.
Lecionar é legal, tenho conseguido ter prazer em estar em sala de aula, trocar com os alunos, rir com eles: mesmo às vezes me estressando com a barulheira ou dispersão, de forma geral tenho feito esse trabalho de forma tranquila e, espero, gradativamente melhor. Depende do dia, depende da turma, depende do assunto.Mas só este semestre comecei a orientar. São seis projetos, alguns individuais, outros coletivos. Não pagam muito bem, comparando à mão de obra que dá. Mas é uma experiência que não tem preço!A analogia mais óbvia que tenho a fazer é a de que sou a parteira desses projetos por vir. O trabalho é preparado por eles, mas a mim cabe ajudar no processo, e sempre da forma perfeita - nem ativa demais, que interfira no produto em si, tornando-o meu ao botá-los completamente sob minhas asas, nem omissa demais, o que causaria a 'morte' do futuro rebento.
Essa forma perfeita diz respeito à necessidade de cada um desses estudantes 'grávidos' de informação: eu não posso nunca ser igual com todos eles, pois cada um precisa de mim de forma diferente. E é isso que me angustia e emociona. Acho que é um momento especial também para mim, esse momento de partejar idéias, respeitar ritmos, cortar excessos, preservar belezas, estimular produções, incentivar, vibrar junto, doar, receber.Mais que nunca lembro de como me senti, quando era 'primípara' e Tina, minha orientadora da graduação, cometeu atos desatinados, 'anti-profissionais', chegando a me hospedar em casa durante uma semana para compensar um período de pouca produção. Mais que nunca lembro de como me senti quando Salett, minha orientadora de mestrado, soube me deixar livre para tomar minhas próprias decisões metodológicas, o que foi essencial na construção do meu trabalho. Mais que nunca penso em Afonso, meu orientador de doutorado, e na paciência que vem demonstrando, num momento em que me sinto confusa e perdida e pouco interessante/interessada.
Quem quiser ache piegas, mas acho que é um momento de dádiva. E quando eu participo dele, devolvo o que recebi, recebo o que me doam, e me integro num todo tão grande, meu Deus, que não posso deixar de agradecer.

Auauau


Eu voltava tarde pra casa e, toda noite, lá estava o viralata na esquina. Eu sabia que era o mesmo pelo tamanho - era bem grande - e pela peculiaridade de ter um olho castanho e outro azul. Ele me farejava, meio cismado, mas, com o tempo, ficou meu amigo: latia, me cumprimentando, de longe, e me acompanhava até a porta do prédio, no fim da rua. Um dia comentei com meu irmão Gabriel a delicadeza do cachorro, como eu achava legal ele me fazer companhia. Aí Gabi virou pra mim bem sério e perguntou: e tu nunca dá nem um real pra ele?