9.10.05

Amor de Umbigo


Quando minha sobrinha Luiza nasceu, eu mandei um email pra ela, de tanta saudade do que não conhecia: longe, aqui no Rio, tudo o que queria era botar ela no colo. Aí escrevi uma ‘coisa’ que enviei pra um monte de amigos, e que reproduzo aí embaixo. Eu, porém, só aguentei quinze dias longe dela. Acabei achando um jeito de ir pro Recife conferir in loco os olhinhos azuis e o riso fácil de Luluca. Sou uma tia coruja, dominada e acabada, ponto final.

O mais engraçado foi que minha tia materna, Rosa, e minha tia paterna, Cristina, quando leram o texto abaixo fizeram o mesmo comentário: “o mais bonito de ver é seu amor por seu irmão”. Eu não sabia que dava pra notar... Mas ele aumenta mesmo, a cada dia. De meu inimigo de infância, Gabi se torna cada vez mais uma referência enorme na minha vida, um pedaço de mim fora de mim, alguém que eu sei que vai estar disponível pra me ajudar e amar mesmo sem grandes grudes e quase sem trocar palavras.

Boto aqui o texto falando de Luluca e uma foto dos dois. Dá um prazer danado ver como minha sobrinha tem um pai que vale o nome, e como eles se conhecem e se comunicam bem, em tão pouco tempo de convívio.

Menininha,

Eu estou tão longe de Recife, que o jeito que achei de estar junto de você foi mandando este email. Queria poder botar você no colo, beijar seu pé e ver afinal como é sua carinha, com quem você parece, conferir de quem são os pedacinhos de que você foi feita e que resultaram num ser humano único.

Quando você estava na barriga da sua mãe, a gente brincava olhando as ultrassonografias e escolhendo os traços físicos que de pior havia na família, de um lado e de outro, como se você fosse um monstrinho em preparação. Era mais ansiedade que outra coisa: você foi sempre muito amada e esperada e querida.

Eu chorei de alegria quando soube que você nasceu. Você acaba de me transformar em tia, um ser bobo e encantado com sua existência. Nem por isso sou grande coisa: você tem mais três tios pra lhe bajularem, e eles estão aí, bem juntinho. Fora os tios-avós, os primos e amigos candidatos a tios... Não, eu não sou nada. Você, sim, é especial. Minha única sobrinha. A primeira de uma nova geração. A primeira grande alegria, depois de vários anos de tristeza. Do fundo de mim, vem uma avalanche de bons desejos, uma vontade grande de lhe proteger, de lhe cuidar.

Você é uma menina de sorte, porque nasce rodeada de amor: dos seus pais, dos seus avós, dos seus tios – os de fato e os de coração. O meu amor é mais um, mas é incondicional e pra sempre. Amo você desde sempre, por tudo, em tudo. Você pode até torcer pelo Sport!Um dia a gente vai se conhecer “ao vivo” e eu vou lhe contar muitas histórias, como a de Peixotinho, um tubarãozinho que eu e Gabriel achamos na praia, muitos anos atrás. Vou balançar você na cadeira que foi de vovó Nagicina, vou cantar pra você as musiquinhas que sua avó Cininha cantava pra ninar nós, os filhos. Vou lhe ensinar os trava-línguas de vovó Sylvia, os poemas que vovô Oswaldo declamava, o jeito que vovô Zezé escrevia no ar. Cresça devagarinho, espere eu chegar por aí...
Eu certamente serei uma tia muito chata, que vai lhe dar livros e kits educativos e lhe levar pra fazer programas culturais fora de mão. Tenha paciência comigo: eu não vou fazer por mal, minha intenção será sempre a melhor. E eu lhe juro!, nunca vou lhe dar roupa de presente até que você descubra o prazer de usar uma minissaia. E quando isso acontecer – lhe prometo! – sou eu quem mais vai lhe dar minissaias, nem que seja só pra deixar Gabriel doido de ciúme.

Qualquer hora eu vou lhe contar como eu sempre sonhei com você, menininha, desde que soube que sua mãe estava grávida. Como eu sempre soube que você era uma menina, pra poder lhe encher de laços e fitas mas também pra que partilhasse comigo as histórias das mulheres de um lado da sua família. Como primogênita, essa é um pouco sua missão...

Você nasce resgatando coisas boas que já se foram: tem o nome de sua bisavó Luiza, nasceu um dia após o dia em que sua bisavó Nageca faria 80 anos... Vem ao mundo com uma base firme, que vai te ajudar a construir um futuro bonito.Daqui de longe, esta tia boba só pode te desejar isso: um futuro bonito.

Queria ser uma fada que nem as dos contos pra garantir que nada de mau vá lhe acontecer pela vida afora, só que isso a gente não pode nunca assegurar, Luluca... Mas o mundo está aí e você agora começa a descobri-lo; vai aprender o que é bom e o que é ruim, o que é grande e o que é pequeno, de quantas cores e formas e texturas os objetos e os sentimentos são feitos... É um processo grandioso e mágico, menininha, abra seus olhos e seu coração.

Tem uma frase de uma música que eu gosto muito que diz assim: “toda vida existe pra iluminar o caminho de outras vidas que a gente encontrar”. Teu nome, “Luiza”, é essa promessa, e que você seja sempre isso, uma luzinha firme e quente. Brilhe, brilhe muito.

Eu te amo, minha sobrinha.

Rio, 25 de março de 2005.
*Postado originalmente no Sítio de Maricota, em 13 de abril de 2005.

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