10.10.05

Scanning


(Inspirado em uma matéria da Revista Época)


Faz um tempo que li uma matéria sobre gente invisível, e fiquei chocada de ver como não se olham os outros seres humanos nos olhos. Tem gente que me acha doida, que confunde as coisas, mas eu procuro sempre estar inteira nesse contato. É algo que tenho desde sempre e que continuo levando adiante aqui no Rio. Sempre tento construir uma relação afetiva com o que me cerca, em cada pequena coisa. O cara que vende frios no supermercado sabe o tipo de queijo que gosto. A chinesa dona do self-service onde almoço nasceu em Kundun. O bebê da vendedora de pastilhas da saída da estação Uruguaiana teve impetigo, mas já foi ao pediatra. A japonesa do restaurante da rua de trás me encontrou no supermercado e ensinou como cozinhar lulas. O ascensorista do prédio da Espalhafato adora Agatha Christie e Sidney Sheldon. O vendedor de tapioca da Cinelândia é paraibano. O vendedor de bananas da esquina me vende fiado. Baixinho, o garçom do boteco de baixo do meu prédio, me chamou da rua um dia desses pra me dar um pedaço de bolo de aniversário. O atendente da pastelaria duas ruas à esquerda é cearense e primo do atendente da pastelaria duas ruas à direita. O garçom do Doradinho, na Cinelândia, já conhece meus amigos e não me serve mais de dois gengibres por noite, para eu não ficar bêbada. O rapaz que dirige o cybercafé aqui próximo - e que me deu dicas para conseguir acesso mais barato à internet - mora no meu prédio e se chama Gustavo. O cara que me vendeu minhas cortinas se chama Cláudio. O vendedor de presunto é Nelson. E o cozinheiro do samba que frequento é Chiclete. Por enxergar a cada um deles, minha vida é mais colorida e feliz.
*Postado originalmente no Sítio de Maricota, em 15 de agosto de 2005

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